27/02/2011

Sophia.


O gosto incólume que a boca dela dramatizava através da pronúncia, mitigada pela densidade explicativa da verdade, incitava o desejo infantil dos homens de alcançarem tal perfeição entonativa. Ela queria amor e era amada. Davam-lhe o corpo com almas despeças. Davam-lhe mentiras e beijos. E ela rebobinava suas memórias.
Estava fatigada. Sophia era difícil. Era simples, dentro da complexidade dos débeis. A preguiça dos homens a depreciara e ela adormecera no fundo do poço; na mesma cama na qual jazia seu desespero que ecoava nas salas lotadas de surdos. Não havia esforço para ganhá-la e desdenharam da beleza e sensualidade próprias de seu corpo escolástico. Havia reconhecimento, mas não havia platéia. Não havia ouvidos; nem bocas. Havia saliva desperdiçada no palco e palmas colidindo indiferentes.
Havia o amigo e o amante. Não amavam Sophia. Havia um preconceito estridente e silêncio. Havia sentimento sem pulso e o projetor cerebral. Havia memória e o corpo subordinados às máquinas. Amor solidário; triste; vazio. Havia medo do esquecimento; da sorte.
Não havia motivo para descobrir as madeixas e mostrar aos outros a beleza das cordas sensíveis e leves. Não havia verdade na estética bizantina; na alegria boicotada pela razão. Os amigos e os amores eram de barro. Dissolveram-se. A validade do amor é industrial.